Por Maria Auxiliadora Roggério
“Tem dias que eu fico pensando na vida e, sinceramente, não vejo saída.
Como é, por exemplo, que dá pra entender: a gente mal nasce e começa a morrer?
Depois da chegada vem sempre a partida, porque não há nada sem separação.
Sei lá, sei lá, a vida é uma grande ilusão
Sei lá, sei lá, só sei que ela está com a razão.”(Toquinho/ Vinícius de Moraes)
Se a morte é algo natural, por que evitamos pensar no assunto?
Vivemos cheios de sonhos e projetos para o futuro. Pensar na morte nos faz lembrar de nossos limites, de nossa própria finitude. Nossa atitude em relação à morte é de negação. Não enfrentamos os sentimentos, não nos preparamos para a separação e evitamos vivenciar o processo de luto, procurando voltar à rotina o mais rápido possível, acreditando que, desse modo, todo o sofrimento acabará logo.
Quando temos um familiar muito enfermo e existe a possibilidade de morte eminente, já começamos a evitar o tema, tentando não sofrer. Mentimos a quem está morrendo, dizendo que logo estará bem e, dessa forma, impedimos que este possa falar de seus sentimentos, comunicar-se, despedir-se.
Delegamos a um hospital os cuidados com o doente, esquecendo que nas últimas horas a pessoa pode estar sendo bem cuidada, mas são cuidados profissionais. A presença de familiares e de amigos é muito rápida, restrita a visitas com horário marcado. Assim, a possibilidade de viver a doença com dignidade e aceitação da morte, a comunicação dos sentimentos e vivência dos processos emocionais que permeiam esse período, ficam prejudicados.
Se, ao contrário, os sentimentos puderem ser expressados, os desejos e as preocupações puderem ser comunicados e as despedidas realizadas, o processo de enfrentamento do morrer e da morte, estarão facilitados, bem como a realização dos rituais de despedida – que, atualmente, quase não existem – e do processo de luto.
Quanto ao processo de luto pela perda de um ente querido, é preciso ressaltar que trata-se de um processo particular, individual, vivenciado de formas diferentes por cada pessoa e elaborado em tempos distintos.
Vai depender de vários fatores que transitam desde a influência socio-cultural, religiosa, circunstâncias e características da doença ou da morte, afinidades/tipo de relação com o morto, a questões pessoais, familiares, personalidade do enlutado, outras situações de perdas, envolvimento com o ocorrido, apoio recebido no período e expressão dos sentimentos.
A negação da morte de um ente querido tem caráter adaptativo e protege o enlutado de um sofrimento psíquico incapacitante. O tempo e a natureza da negação se revelará ou não adaptativa para cada enlutado.
Luto: e essa dor que não passa?
Embora as pesquisas registrem que a expectativa de vida é cada vez mais longa, um dia, inevitavelmente, a morte chega.
Não queremos acreditar que aquela pessoa a quem tanto amamos nos deixou, mas, infelizmente, a perda é uma realidade que precisamos aceitar.
Sentimos raiva, ficamos irritados, pensamos que poderíamos ter feito mais pela pessoa, achamos que a culpa é nossa, sentimos saudades, tristeza, solidão, nos deprimimos. São emoções que precisamos reconhecer e elaborar.
Não conseguimos dormir direito, perdemos o apetite (ou, ao contrário, não paramos de comer), choramos, sonhamos com quem se foi, ficamos com raiva de Deus, perdemos a fé.
Nos afastamos dos amigos e parentes, não conseguimos mais trabalhar direito e parece que não somos mais ninguém, sem o falecido(a).
Precisamos reconstruir a vida sem a pessoa que morreu e adaptarmo-nos a essa nova realidade.
Há um período para vivermos essas reações comuns ao luto. Quando conseguirmos nos ajustar ao fato de que o falecido não está mais presente, e investirmos emocionalmente em outra relação, então teremos superado essa fase e seguiremos adiante.