As descargas elétricas atmosféricas podem causar grandes prejuízos materiais, principalmente em sistemas que envolvam eletricidade. Como os raios podem afetar os equipamentos eletro-eletrônicos e como protegê-los?
A norma NBR 5419 da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) aborda a proteção de estruturas contra descargas atmosféricas. Em 2015, ela foi atualizada com base na norma IEC 62305 da Comissão Eletrotécnica Internacional, organização internacional de padronização de tecnologias elétricas, eletrônicas e relacionadas. O objetivo é a segurança das estruturas e de tudo o que tem dentro.
A parte sobre gerenciamento de risco contempla as características da construção para fazer seu cálculo de risco. Dentre elas, estão tamanho, altura, número de pessoas e horas/tipo de ocupação, local, número de raios por quilômetro quadrado da região (mapa ceraunico, também chamado de densidade de raios), se ela está isolada ou se tem outros prédios próximos, se a energia e outras fontes de sinais chegam por via área ou subterrânea e sistemas pré-existentes de proteção.
O resultado dessa conta gera quatro tipos de riscos: perda de vida humana, perda de serviços ao público, perda de patrimônio e perdas econômicas. Esses valores devem ser comparados com o risco tolerável: se for maior que o tolerável, devem ser implementadas medidas de proteção e mitigação (como extintores de incêndio apropriados para eletricidade).
Como a descarga atmosférica pode afetar a instalação elétrica e equipamentos?
O fio terra é um condutor de proteção. Existem diferentes aterramentos: do para-raios, da instalação elétrica, da subestação de energia, de um tanque (para evitar correntes espúrias que deem um choque no usuário). Uma pessoa pode ser o aterramento, por exemplo ao encostar em um carro e descarregar o excesso de cargas elétricas estáticas em seu corpo para o solo, gerando um leve choque.
Pela norma, esses aterramentos devem ser único e interligados à rede elétrica, pois ele será o referencial de tensão para as outras alimentações. Por exemplo, se acontecer um curto-circuito, essa energia deve ir para o aterramento e desligar o disjuntor, protegendo o equipamento e o usuário. O fio terra de chuveiros elétricos e o terceiro pino das tomadas são exemplos disso.
Ao falar em proteção contra raios, provavelmente a primeira coisa que vem à cabeça é o para-raios, cujo nome técnico é SPDA: sistema de proteção contra descargas atmosféricas. Ele é instalado na estrutura para que a descarga que vem da nuvem, em vez de atingir a estrutura, seja desviada para o para-raios. A corrente elétrica é então conduzida adequadamente para que uma parte seja dissipada na terra.
A outra parte dessa eletricidade vai para o Barramento de Equipotencialização Principal (BEP), que tem o objetivo de possibilitar a interligação de todos os elementos da edificação que possam ser incluídos na equipotencialização principal. Ou seja, uma ligação entre as partes metálicas da edificação ao SPDA, diretamente através de condutores, ou indiretamente através de Dispositivos de Proteção contra Surtos (DPS).
Além disso, existem as correntes induzidas. Por exemplo: quando a corrente elétrica do raio percorre os condutores de descida, ela tem um grande campo elétrico associado, que acaba acoplando aos vários circuitos que existem dentro da edificação e gerando surtos induzidos. Esses surtos que geram a queima dos equipamentos.
Isso também pode acontecer quando um raio cai muito próximo da construção. O raio pode atingir diretamente a linha de transmissão de eletricidade – eles são responsáveis por 70% do desligamento das linhas de alta tensão e 30-40% das de média tensão (das ruas). Nesse caso, ele vai ser conduzido, passando pelo transformador e entrando na edificação, gerando os surtos que vão se propagar pelo material condutor e queimar os equipamentos.
Quanto aos transformadores, eles geralmente possuem outro dispositivo na parte de alta tensão, também chamado de para-raios. O para-raios não atrai nem repele os raios, tampouco descarrega as nuvens como se pensava antigamente. Ele simplesmente oferece ao raio um caminho fácil e seguro até o solo. Sua função também é a de desviar os surtos elétricos para a terra, evitando a queima do dispositivo. Mesmo assim, uma parte do surto acaba passando para a linha de baixa tensão e entrando na edificação.
No quadro de distribuição de energia da construção, pode-se também instalar Dispositivos de Proteção contra Surtos (DPS). Eles têm como objetivo limitar sobretensões transientes e também desviar as altas correntes provenientes de descargas atmosféricas. O mais completo é coordenar esses dispositivos de modo que a proteção mais forte fique na entrada da energia na edificação, um menor no quadro de distribuição da casa e outros junto aos equipamentos a serem protegidos.
Normalmente, os equipamentos possuem uma tolerância para surtos, mas alguns podem ser muito sensíveis e exigirem uma filtragem extra. Ultrapassando esse limite, pode ser gerado um centelhamento (faísca) nos circuitos internos do aparelho e ocasionando a queima de equipamentos. Algumas réguas de energia possuem proteção contra surtos embutida (através de um varistor ou algum outro dispositivo), mas em muitos casos não são de boa qualidade.
Além da entrada de energia elétrica, existem equipamentos com outras entradas de sinal, como um telefone fixo ou um roteador. Se um surto vier pelo cabo metálico de rede, pode queimar a placa receptora do sinal. Por vezes, pode até ser instalado um disjuntor/interruptor diferencial: um dispositivo de proteção que permite desligar um circuito sempre que seja detectada uma corrente de fuga superior ao valor nominal.
Por isso tudo, é indicado retirar os equipamentos elétricos da tomada e outros caminhos que possam conduzir a eletricidade. Isso inclui o celular carregando e equipamentos em stand by, e não adianta deixar o plug muito perto pois pode gerar uma faísca. Existem muitos casos de edificações destruídas por raios em todo o mundo.
Veja mais sobre monitoramento de no-breaks (UPS) e probabilidades de quedas de raio nos posts dos links.
Fontes
No inverno (clima seco), sempre levava choques ao sair do carro; consigo evitá-los tocando nos vidros para fechar a porta, mas, certamente, há explicação científica para isso ou só coincidência?
Tem explicação sim. Ao se movimentar no carro em um dia seco, o acúmulo de cargas por energia estática dissipa bem mais lentamente. Assim, caso encoste em um objeto com com um potencial diferente, ocorre transporte de cargas e um choque. Se abrir a porta do carro e se movimentar segurando na porta do carro (parte aterrada), as cargas se equilibram continuamente, sem haver uma corrente suficiente para perceber um choque.