Quase todos os tradicionais doces portugueses trazem como ingredientes principais gema de ovo, farinha e açúcar – às vezes um pouco de amêndoas. Eles fazem parte da chamada “doçaria conventual”, pois eram elaborados por freiras e monges em conventos. Daí surgiu o creme de pasteleiro (mistura de gemas com leite e uma farinha que engrosse a mistura), com uma consistência espessa e cor amarelada, muito comum nos sonhos ou mil folhas.
A clara era utilizada para engomar parte das vestimentas das religiosas e para clarificar o vinho. A gema de ovo passou a ser muito usada porque dá uma consistência mais delicada aos doces. Os doces eram feitos com mel, adotando o açúcar no século XVI, com o início da exploração de cana na Ilha da Madeira e no Brasil.
Os primeiros doces conventuais portugueses eram chamados “fartéis”. Chegaram ao Brasil logo nas primeiras caravelas, mas foram recusados pelos índios, conforme relatou Pero Vaz de Caminha:
“Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, fartéis, mel, figos passados. Não quiseram comer daquilo quase nada; e se provavam alguma coisa, logo a lançavam fora.”
Somente com a instalação da família real no Rio de Janeiro que a doçaria conventual se desenvolveu no Brasil.
Em São Paulo, existem as docerias Quinta do Marquês e Casa Mathilde, que apresentam muita variedade. Para comer os doces em Portugal, o site Cultuga tem algumas dicas.
Veja alguns dos mais famosos doces portugueses e descubra a origem de muitas das sobremesas que são saboreadas também no Brasil (em ordem alfabética).
Observação: “torta”, em Portugal, tem o mesmo significado de “rocambole” no Brasil – as tortas que conhecemos no Brasil são chamadas de “tartes” em Portugal. No espanhol, “pastel” significa “bolo” – a origem desta palavra vem do italiano “pastello” e significa “material reduzido a uma pasta”, e provavelmente era relacionado somente a doces no início. Já “pastel” em espanhol é chamado de “tarta”. Outra curiosidade: o bolinho de bacalhau, como conhecemos no Brasil, é chamado pastel de bacalhau em Portugal.
Arroz-doce
Também de origem asiática, é feito de arroz cozido em leite e açúcar, temperado com casca de limão, canela em pau, água de flor de laranja, cravo e polvilhado de canela.
Baba de camelo
Sobremesa feita com leite condensado e gemas de ovo batidas, resultando em uma textura cremosa e doce – como se fosse um mousse de doce de leite.
Biscoito Areias de Cascais
Bolinhos conhecidos simplesmente por “Areias”, tiveram origem na vila de Cascais no século XIX. A receita tradicional baseia-se numa massa simples de manteiga polvilhada com açúcar, mas algumas variações possuem raspa de limão, canela ou baunilha.
Bolo de Arroz
Apesar do nome, é um bolinho amanteigado com rum e limão, relativamente seco se comparado com os outros doces.
Bola de Berlim
Inspirada na famosa Berliner (um doce típico alemão), chegou a Portugal pelas mãos das famílias judaicas que fugiram da Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial. No Brasil, é conhecido como “sonho“.
Bolo rei
Sobremesa tradicional de Natal em Portugal. É um bolo doce e rico, geralmente feito com uma massa fofa e enriquecido com frutas secas, frutas cristalizadas e nozes. É decorado com açúcar em pó e frutas secas inteiras.
Brisas do Liz
Originário da região de Leiria (centro de Portugal), seu nome é uma alusão ao principal rio que banha a cidade e foi criado no antigo convento dominicano de Santana, que já não existe mais (1494 a 1880). Feito a base de ovos, açúcar e amêndoas moídas, acredita-se que tenham servido de inspiração para a criação do quindim no Brasil – diante da falta de amêndoas, usou-se o coco ralado, que era barato e facilmente encontrado por aqui.
Carriço
Doce feito principalmente de claras de ovo batidas em neve com açúcar (basicamente um suspiro) e pode ser aromatizado com baunilha ou outros sabores. Existem variações regionais e receitas específicas que podem adicionar ingredientes como amêndoas.
Delícia de Laranja
Tradicional bolinho de laranja, mas bem mais molhadinho do que um “bolinho pullman” industrializado.
Disco
Massa folhada em forma de disco, coberta com suspiro e recheio de massa de ovos.
Filhós
Espécie de fritura doce, feitas com uma massa de farinha, ovos e fermento, fritas em óleo quente. São geralmente consumidas como sobremesa em ocasiões festivas, como o Carnaval, e podem ser polvilhadas com açúcar e canela.
Fios de ovos
Também conhecidos como “Palha de Abrantes”, é formado da gema em formato de fios com açúcar. Comumente é utilizado como recheio ou cobertura de bolos.
Folar de Olhão
Também designado folar de folhas ou folar do Algarve, é um bolo tradicional da Páscoa. É conhecido pela sua composição em camadas, cobertas por açúcar, manteiga e canela, que criam folhas caramelizadas de aspeto singular.
Fofo de belas
Massa de pão de ló bem leve com recheio de creme tipo sonho.
Guardanapo
Massa de bolo (pão de ló) bem fofinha, recheada com doce de ovos e dobrada como um guardanapo de papel.
Leite creme
Também conhecido como Creme brulée (francês para “creme queimado”), tem os primeiros registros na França do final do século XVII. A receita era então à base de gemas de ovos e leite, com uma pitada de farinha. Depois vieram o açúcar e a queima na parte de cima.
Mimo da Pena
Doce com base de coco, creme de gemas e cereja: quindim gourmet.
Noz de Galamares
Doce com massa de nozes coberto com uma capinha de caramelo e uma noz inteira.
Ovos Moles de Aveiro
Massa composta por gema de ovo, açúcar e água envolvida por uma película semelhante a uma hóstia, com formato geralmente de concha. Existe também a variedade de “ovos moles pretos”, que possuem chocolate 63% cacau.
Pastel de chila
São pequenas tortas tradicionais feitas com uma massa quebradiça e recheadas com chila, uma compota doce feita a partir do fruto da abóbora. São uma especialidade típica da região de Alcobaça, em Portugal.
Pastel de Feijão
Confeccionado inicialmente em Torres Vedras desde os finais do século XIX, tem como ingredientes base a amêndoa e o feijão branco cozido. Típico do bairro de Santa Tereza (Rio de Janeiro), existe uma variação salgada, recheada com feijão preto.
Pastel de nata
No Brasil, é também conhecido como Pastel de Belém. Isso acontece porque a famosa receita foi inicialmente produzida pela Pastelaria de Belém, a partir da criação original de um pasteleiro do Mosteiro dos Jerônimos. É somente na antiga confeitaria de Belém, fundada em 1837, que ele pode levar esse nome. Nos outros locais, são mesmo os pastéis de nata. Ganhou mais fama no Brasil com a comercialização dos pastéis de nata pela rede de fast food árabe Habib’s, cujo dono é português.
Pastel de São Bento
Bastante massa folhada e recheio de amêndoas – depois de algumas horas de pronto, começa a ficar seco rapidamente. É um dos “carros chefe” da Casa Mathilde.
Pastel de Tentúgal
Originário do Convento de Nossa Senhora do Carmo de Tentúgal (norte de Portugal), é feito de massa folhada e recheios com doce de ovos no formato de “palito folhado” (como antigamente era conhecido).
Pão de Ló
O pão de ló foi criado pelo cozinheiro genovês Giovan Battista Cabona que, em sua receita original, era elaborado com ovos, açúcar e farinha de trigo e sem fermento ou xarope. Em Portugal, existem versões modificadas da receita de pão de ló que se tornaram símbolos dessas regiões, como o de Alfeizerão, o de Ovar, o de Margaride e o de Arouca. A versão brasileira é totalmente diferente do original tradicional, principalmente por levar muito menos ovos, e não tem o centro tão cremoso.
Papo de anjo
Bolinho extremamente fofo e bem molhadinho com muita calda.
Pudim abade de Priscos
Típico de Braga (extremo norte de Portugal), é bastante parecido com o tradicional pudim de leite condensado do Brasil, mas leva água, açúcar, limão, canela, ovo e vinho do Porto.
Queijada / Queijadinha
Em Portugal, é um pequeno bolo enformado (geralmente possuem casquinha crocante), confeccionado com queijo (ou requeijão), ovos, leite e açúcar, podendo ter recheio de amêndoa, laranja, ovos, etc. São célebres as queijadas da Madeira, de Sintra, de Oeiras, de Évora e de Pereira.
Queque
Bolinhos individuais, geralmente feitos com uma massa de bolo simples que pode ser aromatizada com limão, baunilha ou chocolate.
Salame de Chocolate
Receita italiana e portuguesa, é feito de chocolate, bolacha do tipo Maria, manteiga, açúcar e gemas. Seu formato semi-cilíndrico e aspecto fazem lembrar o salame tradicional, sendo que o chocolate e os pedaços de bolacha substituem a carne e a gordura.
Sericaia
De origem indiana, veio para o Brasil via Portugal, na época da colonização. É um bolo bem cremoso e molhado, mistura de ovos, limão, farinha, leite, açúcar e canela.
Tarte de Amêndoa
Tradicional de Algarve, a torta possui base de farinha, açúcar, manteiga, ovo, leite e fermento e um recheio com muita amêndoa, além de açúcar caramelizado, manteiga, leite e sal.
Tigelada
Feito de ovos, açúcar e limão, lembra muito um pudim leve com sabor de limão.
Torta de Azeitão
Feito com ovos moles, gema de ovo, açúcar e água. Apesar da aparência de “rocambole”, tem a consistência mais semelhante a de um pudim. Tradicional de Azeitão, uma região do concelho de Setúbal.
Toucinho do Céu
Toucinho (ou toicinho) é um corte do porco (geralmente da barriga), com a gordura e o respectivo couro. O nome “Toucinho do Céu” deve-se ao fato de a versão original ter banha de porco como ingrediente. Consiste numa espécie de bolo feito com açúcar em ponto pérola e gemas de ovos com amêndoas moídas. Pode-se adicionar doce de gila (também conhecida como “melancia de porco” no Brasil).
Travesseiro de Sintra
Massa folhada coberta com açúcar e recheada com creme de ovos e amêndoas, salpicada com canela.
Outras fontes
- Veja – Por que os doces portugueses são tão parecidos?
- Wikipedia – Doçaria conventual
- Doces Regionais
- Cuecas na cozinha – Casa Mathilde
Bom trabalho, só um reparo:
Não é verdade que os doces ou bolos em Portugal sejam chamados de “queijo”. A única situação em que algo desse género pudesse ocorrer seria se o bolo fosse feito de queijo ou tivesse um formato de queijo, e aí talvez pudesse ser chamado de “queijinho”, tal como se tivesse formato de fruta poderia ser chamado de “maçãzinha”, “limãozinho”, etc.
Oi Ana, muito obrigado pela visita e pelo comentário. Acabei de fazer a correção que indicou no texto.