Em 1944, os japoneses começaram a lançar balões de hidrogênio com explosivos em direção aos Estados Unidos. Mas como chegariam até lá? Existem jatos de ar na alta troposfera que começaram a ser mais falados durante as incursões aéreas na Segunda Guerra Mundial na região do Pacífico, quando pilotos notificaram a existência de ventos de cauda acima de 160 km/h em certas rotas.
Correntes de jato
Após a erupção do vulcão de Krakatoa em 1883, observadores climáticos rastrearam e mapearam durante vários anos os efeitos das erupções na atmosfera. Em 1920, o meteorologista japonês Wasaburo Oishi detectou uma corrente de jato de um local perto do Monte Fuji e estudou-a mediante a utilização de um balão meteorológico. Porém, a descoberta das correntes de jato é frequentemente atribuída ao piloto americano Wiley Post, o primeiro homem a voar sozinho ao redor do mundo em 1933.
O meteorologista alemão Heinrich Seilkopf é creditado pelo cunho de um termo próprio para este fenómeno atmosférico, Strahlströmung (literalmente correntes de jato) feito em 1939. A compreensão do funcionamento das correntes de jato foi ampliada através dos voos realizados durante a Segunda Guerra Mundial.
As correntes de jato (ou Jet Streams) são como correntes de ar mais rápidas que fluxo ao seu redor que acontecem na alta atmosfera (na região de nível de voo de cruzeiro). São comparáveis a “rios de ar” no limite entre a atmosfera e a troposfera que se movimentam muito mais rápido do que o resto em volta – como se fosse aquela correnteza no mar que a mãe sempre grita “não pro fundo que o mar te puxa, menino!”.
Os jatos mais fortes são os jatos polares, que ocorrem em torno dos 7 aos 12 km acima do nível do mar (nível de pressão de 250 hPa) entre as latitudes 40°-70°, e os jatos subtropicais, que fluem por volta dos 10 aos 16 km entre as latitudes 20° e 30° de cada hemisfério. A largura de uma corrente de jato é geralmente de algumas centenas de quilômetros e a sua espessura vertical alcança menos de cinco quilômetros.
Estas correntes são provocadas pela combinação da rotação do planeta sobre o seu eixo e o aquecimento da atmosfera. Os circuitos das correntes de jato apresentam formas ondulantes, sendo que cada meandro (ou onda) é denominado por onda de Rossby. As ondas de Rossby são criadas por alterações do efeito de Coriolis (cuja intensidade depende da latitude), e propagam-se em direção a oeste, enquanto que o fluxo no qual estão inseridos se movimenta para leste, retardando assim a migração global das cristas e cavados de pressão a leste em comparação com as depressões atmosféricas de ondas curtas em que estão inseridas. As correntes de jato subtropicais formam-se na fronteira polar da célula de Hadley.
A intensidade e localização da corrente de jato é uma referência para se fazer previsão de tempo. Normalmente, essas correntes ganham força quando é inverno nesse hemisfério. Assim, é um dos fenômenos que explicam o aumento da frequência de frentes frias nesse período do ano.
Já se registraram correntes de jato a mais de 400 km/h. Em 18 de novembro de 1952, a Pan Am (Pan American World Airways) ia de Tóquio para Honolulu no FL 250 (7600 metros), quando se percebeu uma redução substancial do tempo de viagem em cerca de um terço (de 18 para 11 horas e meia)!
Também já foi registrado um Boeing 777 fazendo a rota de New York para Londres que chegou 90 minutos antes do planejado. Nesse caso, a corrente estava com velocidade maior que 200 milhas por hora, resultando em uma velocidade com relação ao solo de 1.224 km/h. Note que, visto da terra, era um Boeing 777 supersônico, mas dentro da corrente de jato ele não estava voando tão rápido, pois estava a uma velocidade por volta de 800 km/h com relação ao ar em volta. Outro exemplo pode ser visto nesse link.
A turbulência de ar claro (CAT – Clear Air Turbulence) é muitas vezes encontrada nas imediações de uma corrente de jato, devido à diferença da velocidade de vento vertical e horizontal das correntes de jato. Em condições extremas, esta turbulência constitui grave ameaça à segurança dos passageiros em voo, como foi o caso da morte de um passageiro na United Airlines no voo 826, ocorrido em 1997.
Balões bomba
Durante a Segunda Guerra Mundial, houve avanços tecnológicos como os foguetes V2, o primeiro caça a jato a entrar em uso operacional (Messerschmidt Me 262), o Projeto Manhattan (que produziu as primeiras bombas atômicas) e o radar, mas também tivemos navios com torres lança-chamas para espantar aviões, a bomba voadora controlada por pombos, os cachorros-bomba russos e os balões de fogo japoneses.
Os balões japoneses tinham 12,80 m de diâmetro, 548 m³ de volume a ser preenchido com nitrogênio, detonador de 19,50 m, com tempo de queima de 1h 22 min. Usavam altímetros para soltar o lastro se o balão descesse demais (ou liberar hidrogênio caso contrário). Planejaram até para que o balão liberasse lastro à noite para compensar a queda de temperatura. No final de 3 dias (o tempo da viagem), o balão soltaria todo o lastro, na sequência as bombas e se autodestruiria.
Sua carga variava entre 15 kg (com ácido pícrico ou TNT), 12 kg (bomba incendiária de termite) e 5 kg (dispositivos incendiários contendo térmite com uma carga de inflamação de magnésio, nitrato de potássio e peróxido de bário). Chegou-se a planejar a implantação de antraz, Pasteurella pestis e até vírus da varíola bovina como arma biológica em balões de fogo, mas o imperador Hirohito não permitiu.
Os sítios de lançamento localizavam-se na costa leste da ilha japonesa de Honshu. Por seis meses, começando em novembro de 1944 foram lançados balões explosivos, num total de 9.300. Carregavam bombas incendiárias e explosivas, a fim de matar pessoas, destruir construções ou deflagar incêndios florestais.
Estima-se que apenas 10% dos balões conseguiram atravessar uma distância de mais de 8000 km e chegar à costa do Alasca, Califórnia, Wyoming, Arizona, Oregons e Canadá. Cientistas estudaram a areia usada como lastro, identificaram espécies de algas diatomáceas e determinaram que a areia vinha de uma praia do Japão.
Alguns jornais publicaram uma ou outra notícia de avistamentos, mas o Departamento de Defesa pediu que não noticiassem nada, para não dar ao inimigo dica se o plano estava funcionando. Por exemplo, em 5 de maio de 1945, um casal e cinco crianças de uma comunidade nos EUA viram um balão caído no meio de um descampado. Ela e as crianças se aproximaram para ver o que era, quando o balão explodiu. Foram as únicas vítimas dos balões incendiários japoneses. Até fizeram um monumento em homenagem às vítimas – clique no link para ver sua localização e fotos.
Two Eagles
Em janeiro de 2015, foi lançado o projeto Two Eagles, com o objetivo de quebrar o recorde de distância percorrida em um balão a gás e, basicamente, refizeram os passos de balões lançados 70 anos atrás. O balão utilizava hélio e sacos de areia como lastro. A cápsula era de kevlar e fibra de carbono, pesando uns 100 kg sem equipamentos.
Decolaram de Saga, no Japão, em 25 de janeiro, pousando 5 dias depois em Baja, México – seu trajeto pode ser visto no link. O vídeo do lançamento está disponível no site do projeto Two Eagles.
Fontes
Impressionada com o uso das correntes de jato para carregar balões com fins bélicos. Eu não sabia desse caso!
E de pensar que muito do que usamos hoje em meteorologia, muitas das tecnologias que para nós são triviais, foram desenvolvidas inicialmente para a guerra.
Adorei o texto, muito interessante. E a confirmação de que os balões realmente cruzaram o pacífico, pela análise de traços de algas presente na areia do lastro. Olha, adorei toda essa história, é do tipo que vou comentar com todo mundo, hehehehe.
Abraços
Pois é, e quando eu ouvi essa história eu não acreditei, só depois de pesquisar eu vi que era verdade mesmo rsrs
Obrigado pela visita e pelo comentário!
Abraços!