Avião cai em Vinhedo e gelo vira suspeito

Em 9 de agosto de 2024 às 11h58, um avião ATR 72-500 da VoePass decolou de Cascavel (PR) com destino a Guarulhos (SP) – voo 2293. A previsão de aterrissagem era às 13h45, mas a partir das 13h21 a aeronave não respondeu às chamadas da torre de São Paulo e caiu em Vinhedo (SP) em uma região de chácaras pouco tempo depois. Entre os 62 ocupantes do avião estavam 58 passageiros e quatro tripulantes, não houve sobreviventes.

Trajetória do voo acidentado, com destaque para os últimos segundos. Fonte: Flightradar24
Trajetória do voo acidentado, com destaque para os últimos segundos. Fonte: Flightradar24

Na área onde o 2Z2283 (número do voo) caiu, havia um alerta ativo para formação de gelo severo entre 12 mil pés e 21 mil, segundo informou o site sueco Flightradar24. O avião voava a 17 mil pés pouco antes do acidente. Para Raul Marinho, piloto e presidente do BGAST (Grupo Brasileiro de Segurança da Aviação Geral), “existiam características de formação de gelo naquele momento em que o avião estava passando”. As regiões Sul e Sudeste têm alerta de frio extremo emitido pelo Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) por conta de uma massa de ar frio que se deslocou pelo continente sul-americano e atua no Brasil até o domingo.

Aviso de gelo sobre mapa e alerta SIGMET. Fonte: Flightradar24
Aviso de gelo sobre mapa e alerta SIGMET. Fonte: Flightradar24

Um vídeo feito pelo empresário Rubens Souza mostra a asa esquerda do avião que caiu com gelo acumulado. Ele viajou no voo 2282, entre Guarulhos (SP) e Cascavel (PR), última rota completa da aeronave antes do acidente. A foto foi tirada às 11h02. Pelo menos dois pilotos que passaram pelo local em horas próximas ao acidente também confirmaram o fenômeno, além de um áudio de uma controladora compartilhado em redes sociais e avisando um piloto que cruzava a região sobre a existência de “gelo severo” entre os níveis 15 mil a 22 mil pés.

Formação de gelo embaixo da asa ao final de voo anterior ao do acidente. Imagem: Rubens Souza (via UOL)
Formação de gelo embaixo da asa ao final de voo anterior ao do acidente. Imagem: Rubens Souza (via UOL)

A formação de gelo nas asas de uma aeronave ocorre quando água em temperaturas abaixo de 0ºC entra em contato com a asa, criando uma camada de gelo que pode alterar sua curvatura e comprometer a sustentação. Isso pode levar à perda de sustentação, resultando em uma queda em espiral, conhecida como “parafuso chato”, da qual é quase impossível se recuperar. Esse fenômeno, chamado de estol, pode ter ocorrido antes da queda.

Existe um checklist que tem que ser memorizado para condições de formação de gelo, que inclui aumento de velocidade, aplicação de potência máxima contínua, desativação do piloto automático (que pode “mascarar” a perda de controle parcial dos comandos causada pela formação de gelo), além de sair imediatamente da área adversa para então contactar o controle de tráfego aéreo.

Aviões comerciais são equipados para lidar com a formação de gelo nas asas, já que este é um problema comum na aviação. Uma ocorrência similar aconteceu em julho de 2013, com também um ATR 72-500, desta vez da TRIP Linhas Aéreas (na época ainda em processo de fusão com a Azul). Nele, a condição de formação de gelo foi confundida com problemas nas hélices, e uma sequência de falhas pela tripulação levou à perda de controle, que conseguiu ser revertida.

Em 31 de outubro de 1994 (Indiana, EUA), um voo da Simmons Airlines 4184 feito com avião ATR 72-212 houve perda do controle da aeronave devido alterações na articulação do aileron que ocorreu após um acúmulo de cristais de gelo além da borda. O relatório do acidente apontou falha do fabricante em não colocar (em manuais e treinamentos) instruções de como lidar em situações assim e das autoridades aeronáuticas na homologação.

Já se iniciou o processo de investigação pelo CENIPA (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) para descobrir as causas do acidente do voo 2293, que serão divulgadas em relatório público ao final dos trabalhos. Esse processo é muito minucioso e pode demorar anos, mas tem como objetivo evitar que novos acidentes aconteçam.

Fontes

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