Alberto Santos Dumont nasceu em 20 de julho de 1873 no sítio Cabangu, no local que viria a ser o município de Palmira (hoje rebatizado “Santos Dumont” em sua homenagem), em Minas Gerais. Seu pai, Henrique Dumont, tinha ascendência francesa, era cafeicultor na região de Ribeirão Preto e foi engenheiro de obras públicas, chegando a trabalhar na construção da Ferrovia D. Pedro II.
Em 1891, Alberto foi à Paris para completar os estudos, e admirou-se com os motores de combustão que começavam a aparecer impulsionando os primeiros automóveis. Comprou um para si, e logo estava promovendo e disputando as primeiras corridas de automóveis da capital da França.
Balões e dirigíveis
Em 1897, fez seu primeiro voo num balão alugado. Um ano depois, subia ao céu no balão Brasil, construído por ele. O princípio do balão era de encher um grande volume com um gás mais leve que o ar ao redor (ar quente ou hidrogênio), de modo a criar um empuxo que fizesse todo o conjunto subir. No entanto, o sistema de cesta e balão depende muito das correntes de vento na atmosfera local para ir de um ponto a outro.
Buscando a solução para o problema da dirigibilidade e propulsão dos balões, projetou então o seu número 1, com forma de charuto, hidrogênio e motor a gasolina. No dia 20 de setembro de 1898, realizou o primeiro voo de um balão com propulsão própria. No ano seguinte, voou com os dirigíveis número 2 e número 3.
O milionário Henry Deutsch de la Muerte ofereceu um prêmio de cem mil francos a quem partisse de Saint Cloud, contornasse a torre Eiffel e retornasse ao ponto de partida em 30 minutos. Santos Dumont fez experiências com os números 4 e 5 até que, em 19 de outubro de 1901, cruzou a linha de chegada com o número 6, um dirigível formado por um balão de hidrogênio e um motor de combustão interna. Santos Dumont continuou construindo seus dirigíveis, com destaque para o número 11 (um bimotor com asas) e o número 12, que parecia um helicóptero.
Aviões
Em 1906, foi instituída a Taça Archdeacon para um voo mínimo de 25 metros com um aparelho mais pesado que o ar, com propulsão própria. O Aeroclube da França também instituiu um prêmio com o mesmo intuito mas alguns critérios diferentes.
O 14-bis era constituído por um aeroplano unido ao balão 14, que fora utilizado em voos feitos por Santos Dumont em meados de 1905. Daí o nome “14-bis”, isto é, o “14 de novo”, devido ao fato de o balão estar sendo reaproveitado. A função do balão era reduzir o peso efetivo do aeroplano e facilitar a decolagem, mas acabou gerando muito arrasto e não permitia ao avião desenvolver velocidade. O aeroplano era construído principalmente de seda japonesa, bambu e alumínio.
Santos-Dumont transformou o 14-bis no “Oiseau de Proie” (francês para “ave de rapina”) ao substituir o motor Antoinette de 24 cavalos-vapor (utilizado em velozes lanchas de corrida da época) por um de 50, envernizou a seda das asas para aumentar a sustentação, retirou a roda traseira, por atrapalhar a decolagem, e cortou a estrutura portadora da hélice. Com ele, obteve um salto de 11 metros em 13 de setembro de 1906.
Finalmente, em 23 de outubro de 1906, no campo de Bagatelle (Paris), o “Oiseau de Proie II” fez várias tentativas de voo. Às 16h45min, partiu contra o vento e percorreu 60 metros em 7 segundos, a uma altura de aproximadamente 3 metros, perante mais de mil espectadores e ganhando o Prêmio Archdeacon. O feito foi registrado pela companhia cinematográfica Pathé, e reconhecido oficialmente pelo Aeroclube da França.
O vídeo a seguir mostra quatro réplicas do 14-bis expostas No Museu do Amanhã (exposição temporária), Museu Aeroespacial, Petrópolis e Praça Campo de Bagatelle (São Paulo/SP), no qual são explicados seus componentes e como era controlado em voo (esquemas de sua construção e movimentação podem também ser vistos no link):
Basicamente, como funcionava o 14-bis? A partida era dada girando a hélice, localizada na parte traseira da aeronave. Possuía um cubo à frente do avião onde haviam as superfícies de comando responsáveis por subir e descer o avião, além da movimentação para os lados através da movimentação do cubo ao redor de seus respectivos eixos. O piloto ficava em uma cesta de vime, onde controlava a subida/descida através de uma alavanca com a mão direita e virava para os lados usando uma roda com a mão esquerda. Os ailerons, localizados nas pontas das asas, tinham a função de equilibrar o avião e estavam presos aos ombros do paletó do piloto através de cabos! Ou seja, quando o avião estava “tomando” para a esquerda, ele se jogava levemente para a direta de modo a puxar os cabos, movimentar os ailerons alternadamente e equilibrar novamente o avião ao redor de seu eixo longitudinal.
Em 12 de novembro de 1906, com o avião – agora o “Oiseau de Proie III” – provido de ailerons rudimentares para ajudar na direção, percorreu 220 metros em 21,5 segundos, estabelecendo o recorde de distância da época. O feito foi registrado pelo Aeroclube da França em um monumento, preservado no campo de Bagatelle até os dias de hoje.
Santos Dumont não ficou satisfeito com os números 15 a 18 e construiu a série 19 a 22, de tamanho menor. Em novembro de 1907, começou a ser produzido o primeiro Demoiselle, um pequeno avião de apenas 56 kg, considerado o primeiro ultraleve do mundo. Só em 1909 conseguiu produzir um avião capaz de voar quilômetros, o Demoiselle IV, com motor Dutheil-Chalmers de 18 cavalos-vapor e asas arqueadas, que produziam bastante sustentação. No primeiro teste, feito no dia 9 de março, o ultraleve caiu logo após a decolagem e ficou com uma das rodas despedaçada. Um mês depois, com a aeronave já reparada, ele realizou um voo de 2.500 metros a 20 de altura.
Nos acervos do Museu Aeroespacial (Rio de Janeiro/RJ) e do Museu “Asas de um sonho” (São Carlos/SP) existem réplicas não-funcionais do 14-bis e de um dos Demoiselle. Outros lugares possuem réplicas do 14-bis:
- Praça Campo de Bagatelle (São Paulo/SP) – vídeo acima
- Praça 14 bis com Avenida Roberto Silveira (Petrópolis/RJ)
- Museu do Amanhã (Rio de Janeiro/RJ)
- Parque Santos Dumont (São José dos Campos/SP)
- Museu de Cabangu (Santos Dumont/MG)
- Aeroporto Estadual Bertram Luiz Leupolz (Sorocaba/SP)
- Praça Santos Dumont (Goiânia/GO)
E outras cidades.
Veja mais sobre a histórica polêmica “Quem inventou o avião?” clicando no link.
Um pouco mais sobre Santos Dumont
Em 1909, ocorreram dois grandes eventos da aviação: a Semaine de Champagne, em Reims, o primeiro encontro aeronáutico do mundo, e o desafio da travessia do Canal da Mancha. Santos Dumont obteve o primeiro brevê de aviador, fornecido pelo Aeroclube da França, e parabenizou Blériot por atravessar o canal da Mancha. Realizou seu último voo em 18 de setembro de 1909. Depois fechou sua oficina e retornou ao Brasil em 1915 por problemas de saúde.
Seu tão característico chapéu panamá amassado ficou nesse estado em 1903, quando tentou abafar com ele o carburador do dirigível nº 09. Quando voltou do passeio, foi fotografado com o chapéu deformado. Fez tanto sucesso que acabou virando seu amuleto.
Sofrendo com a depressão, encontrou refúgio em Petrópolis, onde projetou e construiu seu chalé “A Encantada”. Nessa casa, estavam diversas criações próprias, como um chuveiro de água quente e uma escada com os degraus recortados intercaladamente para ter uma inclinação maior e não bater o pé quando sobe – note que não tem nada de “só é possível começar a subir com pé direito”, mesmo porque tem uma escada no interior da casa começando com o pé esquerdo. Outro mito é que Santos Dumont teria inventado o relógio de pulso. Na verdade, esse tipo de relógio já existia e era mais comum entre as mulheres. Dumont apenas encomendou um modelo para si por ser mais fácil de observar as horas dessa forma enquanto trabalhava com as mãos ocupadas.
Em 1922, condecorou Anésia Pinheiro Machado, que durante as comemorações do centenário da independência do Brasil, fizera o percurso Rio de Janeiro – São Paulo num avião. Em janeiro de 1926, apelou à Liga das Nações para que se impedisse a utilização de aviões como armas de guerra.
Passou por Araxá/MG, Rio de Janeiro, São Paulo e finalmente no Guarujá, onde se instalou no Hotel La Plage, em maio de 1932. Nesse ano, explodiu a Revolução Constitucionalista, quando o Estado de São Paulo se levantou contra o governo de Getúlio Vargas. Aviões atacaram o campo de Marte, em São Paulo, no dia 23 de julho. Possivelmente esse fato pode ter piorado a angústia de Santos Dumont, que nesse dia, aproveitando-se da ausência de seu sobrinho, suicidou-se, aos 59 anos de idade, sem deixar descendentes.
Fontes
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