Se montar uma empresa competitiva em um grande mercado já era difícil, agora comprar uma casa própria, carro e até outros bens de consumo vem se tornando cada vez mais complicado. Isso não acontece para todas as pessoas, mas uma parcela crescente da sociedade. Ou seja, a impressão é a de vivenciarmos a acumulação de capital e concentração da propriedade. Como isso se dá e qual caminho deve seguir?

Lenin, em sua obra “O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo” (1917), argumenta que o capitalismo atinge um estágio em que grandes monopólios e o capital financeiro controlam vastas porções da economia global, intensificando a exploração do proletariado e a concentração de riqueza nas mãos de poucos. Isso é visto em diversos setores da economia e em diferentes escalas.
Esse conceito pode ser estendido para o consumo moderno de bens duráveis. Com o aumento da financeirização e a crescente dificuldade de aquisição de bens caros, observa-se um padrão em que a propriedade de itens valiosos se concentra em poucas mãos (corporações ou indivíduos muito ricos), enquanto a maioria da população se vê obrigada a “alugar” ou financiar indefinidamente o uso de bens essenciais, como carros, casas e celulares. Isso cria uma situação semelhante à alienação do proletariado dos meios de produção, onde as pessoas têm cada vez menos controle sobre os bens que utilizam no dia a dia.
Essa dinâmica reflete uma forma moderna de alienação, já que os trabalhadores não apenas não controlam os meios de produção, mas também têm dificuldade crescente de acessar bens que antes eram vistos como acessíveis ou fundamentais para uma vida digna. A financeirização da economia e a expansão dos modelos de assinatura, aluguel e leasing para esses bens reforçam a dependência contínua do trabalhador em relação ao capital financeiro.
Dessa forma, é possível perceber que a acumulação de capital não apenas afeta os meios de produção industriais, mas também se estende a outros aspectos da vida cotidiana. Isso intensifica a sensação de que o controle sobre esses bens e serviços está cada vez mais distante, resultando em uma nova forma de alienação que, embora não diretamente relacionada à produção, limita a autonomia e aumenta a precariedade.
Uma sociedade caracterizada pela concentração de riqueza e pela alienação em relação a bens essenciais pode enfrentar várias consequências, que podem se manifestar de diferentes maneiras. A cultura de consumo pode mudar, com um aumento na valorização de modelos de compartilhamento, como caronas e aluguel de bens, em vez da posse. Isso pode criar novas economias colaborativas, mas também pode levar à precarização de relações de trabalho. Mesmo a posterior centralização desse tipo de modelo em poucos aplicativos/empresas também segue o mesmo caminho de monopólio apontado por Lenin.
A concentração de capital nas mãos de poucos tende a aprofundar as desigualdades sociais. Isso pode resultar em uma divisão acentuada entre aqueles que possuem bens e aqueles que dependem de aluguel ou financiamento, levando a uma classe média em declínio e um aumento da pobreza.
À medida que a percepção de injustiça e desigualdade aumenta, pode haver um aumento do descontentamento social. Movimentos sociais, protestos e agitações podem se tornar mais comuns à medida que as pessoas lutam por maior equidade, direitos e acesso a bens e serviços. A pressão social pode levar à implementação de reformas políticas e econômicas. Isso pode incluir a regulamentação mais rígida do mercado imobiliário, a promoção de habitação acessível e políticas fiscais que busquem redistribuir riqueza.
No entanto, essas ações não resolvem o problema em definitivo, ainda mais pensando em uma escala de tempo geracional. Marx argumentou que o capitalismo contém contradições intrínsecas que eventualmente levariam à sua autodestruição. A concentração de riqueza nas mãos de poucos gera uma polarização entre a classe capitalista (burguesia) e a classe trabalhadora (proletariado), criando tensões sociais. À medida que o capital se concentra, os trabalhadores se tornam cada vez mais alienados do processo de produção e dos produtos de seu trabalho. Essa alienação, precarização e desigualdade devem intensificar a insatisfação e a revolta entre os trabalhadores.
Para Marx, os trabalhadores se tornariam cada vez mais conscientes de sua opressão nesse cenário, levando a um aumento da luta de classes. Essa consciência de classe poderia culminar em revoluções sociais, onde o proletariado se mobilizaria para derrubar a burguesia e estabelecer uma sociedade sem classes.
Lenin desenvolveu a análise de Marx, argumentando que a fase final do capitalismo é o imperialismo, caracterizada pela concentração de capital em grandes monopólios e pelo controle do capital financeiro. Isso poderia resultar em uma maior repressão das massas e no fortalecimento do estado burguês, o que, paradoxalmente, poderia aumentar a resistência e o descontentamento entre os trabalhadores. O proletariado, uma vez consciente de sua condição, se organizaria para derrubar o sistema capitalista e estabelecer um governo socialista.