O Palácio Nacional de Queluz começou a ser construído em 1747, originalmente como um pavilhão de caça para o infante D. Pedro, futuro D. Pedro III, consorte da rainha D. Maria I. A partir de 1755, o palácio foi expandido e transformado em uma residência real de verão. O projeto arquitetônico seguiu os estilos barroco, rococó e neoclássico. Ao longo do século XVIII, o palácio tornou-se um importante centro da vida cortesã, especialmente até o início do século XIX.
Os jardins do Palácio de Queluz são uma parte essencial de seu conjunto arquitetônico. Inspirados nos jardins franceses da época, foram desenhados com grandes áreas ajardinadas, fontes, estátuas de mármore e esculturas de inspiração mitológica. O Canal dos Azulejos, um dos destaques, é um canal de água com painéis de azulejos que retratam cenas bucólicas e marinhas. O Jardim Pênsil e o Jardim de Malta são outras áreas destacadas, frequentemente usadas em cerimônias e eventos reais.
Entre as principais salas do palácio está a Sala do Trono, destinada a eventos oficiais e banquetes, com decoração em estilo rococó e detalhes dourados. A Sala dos Embaixadores, também conhecida como Sala do Grande Jogo, era usada para recepções e destaca-se pelo seu piso de mármore e pinturas no teto. A Sala da Música, dedicada a concertos e apresentações musicais, é outro espaço notável. O Quarto de D. Quixote, utilizado por D. Pedro I (D. Pedro IV de Portugal), é um dos cômodos mais preservados.
Azulejos do Corredor das Mangas
O Corredor dos Azulejos é uma das áreas mais icônicas do Palácio Nacional de Queluz. O nome “Corredor das Mangas” refere-se às mangas de vidro que protegiam as velas do vento. As correntes de ar no local eram frequentes devido à configuração dos prédios, que canalizam o vento para o local.
Este corredor é inteiramente revestido com azulejos do século XVIII, em estilo rococó, que retratam uma ampla variedade de temas decorativos. Entre as representações estão as estações do ano, simbolizadas por figuras alegóricas que destacam aspectos específicos de cada época. Além disso, o corredor inclui imagens dos continentes, seguindo o imaginário geográfico da época, bem como cenas da mitologia clássica, com referências a divindades e episódios mitológicos.
Um dos painéis de azulejos é bem curioso por apresentar um espelho, sendo assim uma composição rica em simbolismo. Nele, a luz refletida no espelho coloca fogo em uma porção de madeira. Espelhos eram historicamente usados para acender fogo, refletindo e concentrando a luz solar em um ponto específico, o que poderia inflamar materiais inflamáveis como madeira ou palha. Este uso prático de espelhos já era conhecido desde a antiguidade, sendo associado ao poder da luz solar concentrada.
No entanto, há uma grande probabilidade de que essa cena tenha um significado alegórico, especialmente considerando o contexto artístico do século XVIII. A figura ao centro está segurando o espelho de modo a posicioná-lo para direcionar o feixe de luz. Este feixe desce do topo do painel, onde há nuvens e raios de luz, sugerindo uma fonte celestial ou divina. O espelho na ilustração pode estar relacionado ao conceito de reflexão (tanto literal quanto figurativa), com a luz representando a verdade ou a sabedoria sendo captada e dirigida pelos seres humanos.
A cena pode simbolizar a chama do conhecimento ou o poder iluminador da razão. O espelho, ao refletir a luz — tradicionalmente associada à verdade, sabedoria ou inspiração divina —, inicia um fogo, que pode ser interpretado como o despertar do entendimento ou da transformação por meio da aprendizagem. A luz que acende o fogo pode ser vista como uma metáfora da razão ou da ciência, capaz de “iluminar” a escuridão da ignorância.
Essa interpretação é consistente com o pensamento iluminista que influenciava o século XVIII em Portugal e em toda a Europa. O Iluminismo promovia a ideia de que o conhecimento, representado pela luz, tinha o poder de transformar e “iluminar” a sociedade. O fogo, nesse sentido, pode simbolizar a paixão intelectual, a chama do progresso ou a transformação que ocorre através da aquisição de conhecimento.
Ao redor da figura central, há mais duas figuras humanas sentadas, provavelmente representando pensadores ou estudiosos em atitude contemplativa ou de trabalho. Uma das figuras parece estar observando a luz refletida pelo espelho, enquanto outra segura uma ferramenta. No centro da composição há uma pirâmide, possivelmente representando a busca pelo conhecimento, um símbolo comum em representações alegóricas que remetem à construção do saber.
No canto superior esquerdo, há o que parece ser uma ave fênix, um símbolo tradicional de renascimento e imortalidade, que pode estar relacionado ao processo de renovação ou à transmissão de ideias e iluminação espiritual. O cenário inclui plantas e flores, o que reforça a ideia de crescimento, fertilidade e desenvolvimento, temáticas comuns em alegorias associadas ao florescimento intelectual e à natureza.
Alguns dos azulejos próximos às janelas apresentam pinturas de nuvens. Nuvens em azulejos servem para criar uma continuidade visual ou uma sensação de amplitude, principalmente em ambientes com muitas janelas. Eles podem ser usados para dar uma sensação de leveza e de conexão com o exterior, como se o espaço interno estivesse em harmonia com o céu ou o ambiente natural do lado de fora. Essa técnica decorativa pode suavizar as transições entre os painéis mais elaborados e as áreas vazias ao redor das janelas.
As nuvens, quando representadas em painéis de azulejos, podem simbolizar o mundo celestial, divino ou espiritual, frequentemente associadas à iluminação ou à elevação espiritual. Em contextos onde há outras alegorias mais complexas, como as cenas de sabedoria e reflexão, as nuvens podem sugerir a ascensão do pensamento humano ou a busca por verdades transcendentes. Elas também podem indicar uma atmosfera de tranquilidade e contemplação, adequando-se ao propósito do espaço como um lugar de descanso e reflexão.
Outros elementos presentes no Corredor dos Azulejos são as singeries, que consistem em cenas humorísticas de macacos imitando comportamentos humanos, um motivo comum no rococó. Também há chinoiseries, que refletem o fascínio europeu pela cultura oriental, mostrando figuras e paisagens inspiradas na China. Por fim, o corredor exibe cenas de caça, uma atividade popular entre a nobreza da época. Todos esses painéis de azulejos combinam estilos decorativos que enriquecem a narrativa visual do espaço, representando o gosto artístico e cultural do século XVIII.
EXTRA Nuvens no teto do Palácio Nacional da Ajuda
O Palácio Nacional da Ajuda, situado em Lisboa, foi construído no século XIX e serviu como residência oficial da família real portuguesa até o fim da monarquia. A antiga sala dos archeiros (a guarda de honra) dispõe de uma grande varanda virada a nascente, de onde se desfruta de uma excelente vista. O pavimento, de desenho geométrico, é em mármore preto e branco.
O teto apresenta uma estrutura arquitetônica de forma elíptica com uma pintura logo acima que pretende simular a continuidade da estrutura mais abaixo. No meio do teto, um céu de azul suave, com algumas nuvens. Tais pinturas no teto visam criar uma ilusão de profundidade e elevação, dando a impressão de que o espaço se estende para o céu. A escolha de nuvens sugere a leveza e a grandiosidade, simbolizando a ligação da monarquia com o divino ou a inspiração celestial, uma maneira de exaltar o poder e a majestade do palácio e de seus ocupantes.
Fontes