Recomendações para o avanço da inteligência artificial no Brasil

A Academia Brasileira de Ciências (ABC) lançou hoje o relatório “Recomendações para o avanço da inteligência artificial no Brasil”, produzido por um grupo de trabalho da própria ABC formado por cientistas de diferentes áreas e regiões do país. A ideia é fomentar o debate público e promover que o Brasil possa ser um desenvolvedor ativo nessa área, e não apenas um consumidor passivo de tecnologia. O documento completo está disponível no link, mas segue um breve resumo baseado na apresentação realizada pela ABC em sua sede no Rio de Janeiro/RJ.

A inteligência artificial (IA) está para o século XXI assim como a internet esteve para o céculo XX. A disrupção causada pela IA criará um ponto de inflexão na esconomia. O Brasil deve queimar etapas em seu processo de reindustrialização, nos mais diversos setores econômicos, destacando a utilização de IA. Os governos e empresas que souberem sair na frente no uso eficaz dessa tecnologia vão aumentar a sua competitividade.

A IA é uma tecnologia transformadora para diversos setores da sociedade, como educação, energia, saúde e sustentabilidade. Empresas nacionais enfretam desafios para incorporar a IA em seus processos e gerar valor para seus cleintes e para o país. É preciso definir e implementar estratégias de longo prazo, desenvolver tecnologias nacionais e criar soluções centradas no consumidor.

O Brasil deve proteger e aumentar os recursos técnico-científicos nas universidade e institutos de pesquisa, que são fontes de profissionais qualificados e líderes em inovação. Deve-se facilitar e incentivar a comercialização dos resultados de pesquisa por meio de startups fundadas nas universidades. Essas iniciativas podem contribuir para enfrentar a fuga de cérebros e a competição por talentos, oferecendo incentivos adequados para os pesquisadores e professores.

Potencial de uso e aplicações

Muitos países já têm programas estratégicos de investimento em IA, avançando em ritmo acelerado. Existem diversas áreas estratégicas a serem beneficiadas com o uso de IA:

  • Saúde
  • Energia
  • Biodiversidade e biotecnologia
  • Financeira, Bancária e de Seguros (FSB)
  • Educação
  • Pesquisa e Desenvolvimento (P&D)
  • Competitividade das empresas
  • Eficiência e governança do setor público

Dentre as capacidades de IA mais adotadas estão a automação de processos, visão computacional, compreensão de texto e agentes virtuais (como chatbots). Também existem aplicações significativas na otimização de operações de serviços, desenvolvimento de novos produtos baseados em IA, segmentação de clientes, análise de atendimento ao cliente e melhorias baseadas em IA em produtos existentes.

IA em energia

Na área de energia existem aplicações de IA para: (a) modelar fenômenos físicos (como chuva e temperatura), equipamentos (como um conjunto turbina-gerador) e grandezas de interesse (como a demanda de energia); (b) modelos descritivos com processos probabilísticos para produzir cenários futuros, como a probabilidade de chuva, a variação da demanda ou “luzes amarelas” no comportamento do conjunto turbina-gerador; e (c) técnicas de otimização sob incerteza (como Deep Reinforcement Learning) para apoio à tomada de decisão, por exemplo, na operação de reservatórios ou em manutenções preditivas.

A IA oferece a vantagem de representar de forma mais precisa fenômenos complexos que são difíceis de capturar por meio de modelos probabilísticos tradicionais. Isso inclui a variabilidade temporal e espacial na produção renovável e na demanda, especialmente em intervalos curtos, um aspecto de grande importância devido à crescente presença de fontes eólicas e geração distribuída (GD), entre outras tecnologias. Além disso, a IA proporciona benefícios significativos ao permitir o uso inteligente dos recursos existentes. Por exemplo, na área de manutenção preditiva, a IA pode ser mais eficaz e econômica do que as abordagens de manutenção periódica convencionais.

No âmbito da descarbonização, a IA oferece benefícios significativos ao possibilitar o desenvolvimento de novos modelos de circulação atmosférica, analisar vastas quantidades de dados provenientes de satélites para previsão precisa de chuvas e temperaturas, e proporcionar uma representação mais precisa da produção proveniente de fontes renováveis. No contexto brasileiro, é fundamental realizar a transição energética para lidar com as mudanças climáticas, e a IA pode desempenhar um papel crucial nesse processo. Ela pode auxiliar na otimização e integração de diversas fontes de energia, como hidrelétrica, eólica e solar, reduzindo gradualmente a dependência de geradores movidos por combustíveis fósseis.

Além disso, a IA desempenhará um papel fundamental no processo de descentralização da produção de energia em baixa tensão, proporcionando aos consumidores a capacidade de gerar energia por meio de geração distribuída (GD) e serviços de modulação e flexibilidade, muitas vezes com o suporte de sistemas de armazenamento de energia, como baterias. A transição de um sistema de distribuição centralizado para redes descentralizadas requer a criação e o desenvolvimento de tecnologias inovadoras capazes de otimizar soluções que combinem informações de várias fontes de energia. Essas tecnologias inovadoras demandarão o uso de técnicas avançadas de aprendizado de máquina. A digitalização, incluindo o uso de medidores inteligentes e comunicação eficiente, é um componente essencial para viabilizar esse processo de descentralização.

Um dos desafios da IA no setor de energia está relacionado à cuidadosa curadoria dos dados utilizados para treinar os algoritmos. Outro desafio diz respeito à possibilidade de falhas inesperadas e graves na IA, que podem ocorrer devido à complexidade dos caminhos seguidos pelos algoritmos de aprendizado de máquina. A interseção entre a IA e o setor de energia abre caminho para inovações que não apenas melhoram a eficiência operacional, mas também contribuem para abordar desafios ambientais urgentes, posicionando o Brasil e outras nações em direção a um futuro energético mais sustentável e resiliente.

Recomendações

Apesar de potenciais benefícios e oportunidades, há evidências concretas de que as tecnologias de IA podem trazer danos para indivíduos, grupos, sociedades e para o planeta. Entre as preocupações, estão violações de privacidade, criação de ambientes anticompetitivos, piora das condições do mercado de trabalho, manipulação de comportamentos e ocorrência de desastres ambientais. O documento recomenda algumas ações, como:

  1. Formação de recursos humanos qualificados em ciência de dados (isso inclui a disseminação do conhecimento em todos os níveis de educação, o que contribui para engajar a sociedade nas mudanças necessárias, e aumento da massa crítica de trabalho de RH e de educadores);
  2. Política de fixação de talentos, com remuneração competitiva internacionalmente;
  3. Aumento imediato do financiamento pelo governo nessa área e criação de mecanismos que estimulem investimentos privados;
  4. Considerar a criação de uma agência federal, nos moldes da Embrapii, com foco no financiamento de projetos em IA;
  5. Estabelecer política de dados, que regule o acesso aos dados do país por cidadãos e empresas estrangeiras a bancos de dados gerados no país.

O futuro do Brasil depende das escolhas feitas em relação à IA, com investimentos e políticas públicas urgentes sendo cruciais globalmente. O relatório apresenta recomendações para impulsionar o país na área científica da IA, enfocando seu papel no desenvolvimento sustentável e prosperidade para todos. Estabelece princípios para assegurar que a tecnologia não apenas transforme a economia, mas também contribua positivamente para a nação.

Fontes

Atualização: essa notícia foi repostada no FAPESP na mídia.

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